quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Como começou meu interesse pela pesquisa sobre imigração alemã

Abaixo segue um relato meu sobre como comecei a pesquisar genealogia, fotografias antigas e histórias, que resultaram em meu primeiro livro que será publicado no começo de 2010, História da Imigração Alemã no Sul do Brasil.

Por Felipe Kuhn Braun

Pesquiso desde os 14 anos, desde setembro de 2001.

Minha avó paterna que era natural de Bom Princípio (Luzia Vale Heck), morava em nossa casa e sempre contava histórias de família. Ela sabia sobre os tios, primos distantes, avós...parentes em geral. Além de sempre contar histórias de como era Bom Princípio antigamente. Ela faleceu em dezembro de 2000 e no ano seguinte pensei, quanta história (no caso a história oral, contada entre os mais antigos e que pouco foi registrada em gravações ou escritos) se perdeu com seu falecimento. No ano em que minha avó faleceu eu estava no ensino fundamental e a professora tinha pedido para fazermos uma pequena árvore genealógica de nossa família, na época quem me ajudou foi minha avó, meses antes de falecer. Ela faleceu em Novo Hamburgo.

Procurei a árvore e comentei sobre o assunto com uma tia de minha mãe que me trouxe a árvore da família dela (os Jaeger Moraes), pronta até o ano de 1750! Aí comecei a me interessar. Liguei para uma tia de meu pai, que mora em Bom Princípio, a Lourdes Steffen Heck, casada com o Olavo Heck, irmão mais novo de minha avó paterna e fui visitá-los em Bom Princípio. Depois de algumas visitas a Bom Princípio descobri que de minhas famílias ninguém havia pesquisado ainda. Engana-se quem acredita que encontrará informações sobre sua família na internet, quem quer realmente conseguir material, deve visitar as localidades, os familiares, as igrejas, os cemitérios, os cartórios.

Eu visitava os parentes e pedia se conheciam mais pessoas na família que possuíam nomes, informações e fotografias, as vezes alguém dizia, (um exemplo) tem um primo Heck que mora em Feliz, eu procurava na lista telefônica todos os Heck de Feliz, ligava e me apresentava, dizia meu nome, que a pessoal tal me informou sobre ele, e que procurava informações sobre seus irmãos, pais, avós...as pessoas em geral me receberam muito bem nos municípios que visitei. É difícil encontrar alguém que não goste de saber sobre a sua história, sobre a história de sua família, de seus antepassados. Tudo começou sobre um hobby, porém, quanto mais curiosidades e informações eu descobria, maior era o desejo de encontrar mais. Em oito anos de genealogia consegui juntar 300.000 nomes de descendentes de alemães no sul do Brasil.

Mas aí vi o descaso que as pessoas em geral dão para as fotografias. Uma porque não temos como costume escrever atrás das fotos, então em uma ou duas gerações a frente, ninguém saberá quem são as pessoas que temos em nossos álbuns. É difícil encontrar alguém que saiba informações além de seus avós, o que tenha conhecido todos os avós e outros ancestrais. Antigamente as pessoas tinham filhos cedo, mas a maioria das pessoas não vivia muito mais do que 60, 70 anos. Hoje as pessoas vivem até os 80, 90, mas constituem família muito mais tarde. Então eu visitava as famílias, buscava fotografias, identificava todas, uma a uma, escaneava e imprimia elas em papel de fotografia. Aí que começaram a vir as surpresas, fotografias de casamentos onde os vestidos de noiva eram pretos. Fotografias feitas dos falecidos, pois, a distância era grande, quando nem todos os parentes podiam estar no enterro, tiravam uma foto do falecido e enviavam por correio. Aí encontrei cartas, as cartas com a faixa preta, quando alguém as recebia, sabia que um parente ou amigo distante tinha falecido. Encontrei documentos da época do império, cartas enviadas entre os parentes, em alemão gótico.

Porém, toda família que visitava tinha uma história diferente, quantas vezes ouvi "não temos mais fotografias do imigrante, pois, estavam no sotão e depois da reforma colocamos esse material fora". Em uma família me contaram de uma caixa, que ficou por mais de cem anos na família, mas que estava nos últimos anos no paiol que pegou fogo e todo o material acabou sendo queimado. Outros não tinham mais as fotos, pois, as traças tinha comido quase todas. Assim percebi que nomes poderemos encontrar nos livros daqui há décadas, mas fotografias estão se perdendo aos montes, as histórias de nossos municípios e de nossas famílias estão se perdendo. De raríssimos lugares e famílias encontramos fotografias anteriores a 1900, mas de muitas consegui fotografias dos imigrantes, das construções das igrejas, do começo de vilarejos e cidades.

O que era um hobby se tornou uma missão, procurar, encontrar e digitalizar pouco a pouco fazendo visitas no interior, todo o material fotográfico mais antigo, que retrate os imigrante e seus descendentes com seus costumes e hábitos culturais. Encontrei familiares e visitei famílias em Bom Princípio, Feliz, São Sebastião do Caí, São José do Hortêncio, Dois Irmãos, Morro Reuter, Novo Hamburgo, São Leopoldo, Porto Alegre, Gravataí, Picada Café, Ivoti, Nova Petrópolis, Gramado. Também localidades mais distantes como Cerro Largo e Santo Ângelo, perto da fronteira, Ijuí, Itapiranga (na divisa da Argentina com RS e SC), Guarujá do Sul, São Carlos e Joinville (essas três cidades em Santa Catarina). As primeiras localidades fundadas pelos imigrantes foram Ivoti e São José do Hortêncio, depois dali fundaram Dois Irmãos, Bom Princípio, mais tarde Estrela, Lageado (chamadas de novas colônias, em alemão Neu Kolonie), mais tarde Cerro Largo e localidades na região das missões, no começo da década de 1900. Na década de 1910 as primeiras localidades na Argentina (como Puerto Rico nas Misiones), e o oeste catarinense. Depois da década de 1940 os gaúchos descendentes de alemães colonizaram o Paraná, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul e ainda mais para o norte. É fantástico imaginar que milhões de brasileiros tem suas origens nas primeiras colônias alemãs como Ivoti e São José do Hortêncio e que se fossem se reunir todos não teria espaço nessas localidades.

Peculiaridades são muitas, muitas mesmo. Algumas informações gerais, as pessoas viviam bem menos que hoje em dia (uma simples apendicite virava morte e catarata deixava as pessoas cegas, não havia cirurgia para isso), as pessoas tinham muito mais filhos, as famílias eram numerosas, se viam pouco devido a distância e os poucos e lentos meios de locomoção na época. A religião era muito mais forte e presente na vida das pessoas. O preconceito muito maior principalmente entre pessoas de religiões e etnias diferentes. Algumas curiosidades são interessantes, outras tristes, algumas inacreditáveis, outras na época inacetáveis (para a sociedade da época), alguns problemas entre famílias foram escondidos durante décadas devido as pressões da sociedade da época, cada família tem uma história e muitas merecem realmente continuar sem serem contadas. Traições aconteciam, menos que hoje, mas muito mais do que pensamos em relação aquela época. Tudo que acontece hoje em maior ou menor escala, o egoísmo, o altruísmo, o trabalho, a seriedade, a honestidade, a corrupção, as desavenças, as uniões, os preconceitos, os encontros, tudo isso é inerente ao ser humano e aconteceu em todas as épocas.

Informações interessante que descobri sobre a minha família, descobri por exemplo que sou descendente direto de Guilherme Winter, o fundador de Bom Princípio e descobri sua genealogia até o ano de 1690. Descobri que sou descendente de Mathias Mombach, o imigrante fundador de Walachei (interior de Morro Reuter) que foi soldado da guarda pessoal de Napoleão Bonaparte. Sou tataraneto de Franz Adolph Jaeger, imigrante alemão, vindo da Saxônia que se instalou em Feliz e teve seis filhos, os seis professores, um deles Maria Jaeger, a primeira professora de Bom Princípio. Sou trineto de Henrique Roehe, advogado, primeiro escrivão e médico homeopata de Bom Princípio. Quanto a outras famílias, em oito anos consegui juntar 5.140 fotografias antigas de descendentes de alemães no sul do Brasil. Fotos de encontros, dos Kerb, das localidades, escolas, igrejas, missas, das ferrarias, moinhos, padarias, sociedades de tiro, de canto, das congregações religiosas, do trabalho na roça, das casas enxaimel, também dos velórios, da pobreza e da riqueza entre os descendentes de alemães.

Em 2007 fui para a Alemanha, visitei o Hunsrück, passei dias nas casas de parentes distantes, visitei museus, igrejas, monastérios antigos, fiquei na casa de um padre, em um seminário e em um monsteiro. Visitei bibliotecas e trouxe de lá em um mês, material de diversas famílias que descendo, Mombach, Heck, Wolf, Zilles, Kraemer, Kuhn, Holz e tantas outras, o máximo que encontrei foi o histórico de ancestrais pelo lado paterno até o ano de 1375. Trouxe cópias de certidões, de registros de impostos, de livros, bem como 22 livros da Alemanha. Com isso consegui um arquivo de 30.000 nomes de ancestrais dos imigrantes alemães de centenas de famílias da região. Com o histórico completo de famílias como Schaefer, Vier, Finkler, até meados do século XVI. Também o histórico de famílias nobres que vieram para o sul, como os von Hohendorff, cujo a genealogia remonta a Carlos Magno, o mais famoso imperador europeu. Quem acaba pesquisando, estabelece um laço emocional com sua história, tanto material só terá utilidade se for publicado, sendo assim preservado e divulgado. O meu maior objetivo são futuras publicações, já tenho cinco projetos de livros prontos, todos enviados a gráfica, mas estou em busca de patrocínio. O primeiro já está quase pronto para a impressão e será publicado no começo do ano que vêm, os demais são projetos e ainda não foram publicados mas com o tempo acredito tornar isso viável.

Meu maior objetivo e resgatar e preservar essa pequena parte da história fotográfica dos alemães, através da imagem podemos aprender muito sobre determinadas épocas, famílias, costumes e tradições, alguns perdidos para sempre, outros mantidos pelos descendentes. Um falecido jornalista de Novo Hamburgo (Sr. Bruno Dienstmann), em um de seus textos, entregues a meu avô na década de 1970 (meu avô paterno Pedro Albano Braun que também era um apaixonado por genealogia) escreveu: "Pesquisar a história de nossos antepassados, é um ato de gratidão a todos que nos deixaram, tudo aquilo que aí está".

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